A tarde
excelente declinava lenta e sem pressa, o calor era grande, mas não os atingia,
protegidos que se encontravam sob o toldo que dava para a pradaria adjacente ao
jardim. Espandongaram-se nas espreguiçadeiras de vime, um ventilador
borrifava-os com bafejos ritmados de vapor de água, sentiam a gostosa sonolência
do pós-almoço regado a espumante e Vino Tinto. No entanto, a tensão ficara no
ar com as últimas palavras do estrangeiro. Jaqueline quebrou novamente o
silêncio.
― Não
compreendo, o que será que eu teria esquecido sobre você?
― É que, na
verdade, me parece que vocês duas cometeram alguns pequenos erros, erros que
podem lhes custar bem caro ― Radic continuava a mirar fixamente a sua taça
cheia de sangria.
― Nossa Senhora,
pois não é que o amigo Radic agora nos brinda com charadas de sentido duvidoso?
Explique-se melhor, por favor ― Lucía procurava disfarçar o nervosismo que seus
gestos traíam.
― Bem, acho
que como prova de gratidão deste convite generoso de duas belas mulheres
devo-lhes ao menos uma amostra de reconhecimento. Meu verdadeiro nome é Thomas
Boyd, ou, pra fazer um trocadilho fácil, Boyd, James Boyd. Sou agente secreto
americano ― ele riu, mas o seu rosto
desmentia qualquer intenção de graça. Ele olhava diretamente nos olhos das duas
estupefatas amigas.
― Isto é algum
tipo de piada? Se for, meu caro, é uma de péssimo gosto ― Jaqueline levantou
meio corpo para encará-lo de frente, sentia um peso estranho a lhe travar os
movimentos.
― Não,
infelizmente não é uma piada. A maior parte da minha vida tem sido um
emaranhado de mentiras, identidades falsas, mudanças de país e de funções,
enfim, não quero cansá-las com as minhas agruras. É hora de falarmos das
dificuldades em que vocês se meteram ― Boyd/Radic pousou o copo na mesinha ao
lado da espreguiçadeira e adotou um tom sombrio.
― Sou toda
ouvidos, se era pra me assustar, você conseguiu plenamente Mr. Boyd ― Lucí
mexia nervosamente nos seus cabelos, os olhos quase a saltar das órbitas.
― Não vou
negar que vocês tomaram todos os cuidados: desativaram o GPS do carro,
desligaram os celulares... tomaram a precaução extra de utilizar estradas
secundárias para evitar filmagens, etc., só esqueceram o pequeno detalhe de
levar em conta com quem estavam lidando ― ele tomou o copo como se fosse beber,
mas mudou de idéia repentinamente.
― Seja claro
de uma vez por todas! Aonde quer chegar com essa conversa? ― Jaque percebeu que
não conseguia se levantar, a cabeça girava.
― Jaqueline
Arrascaeta, não é? Pois bem, Jaqueline, como eu, você mudou seu nome. Mas,
sinceramente, achou mesmo que eu não ia descobrir? Que tipo de idiota vocês
imaginaram que eu era? Assim, do nada, duas mulheres jovens e lindas estão
super interessadas em me convidar para um agradável fim de semana no campo com
a promessa, aliás bastante explícita, de um ménage à trois ? ― levantou-se com
um movimento elástico, pleno de autocontrole ― Meninas, já faz um bom tempo que
deixei de acreditar em
Papai Noel.. .
Lucí tentou se
levantar, mas desabou pesadamente no espaldar da cadeira. Sentia um sono
sobrenatural, percebeu que a sua voz e a da amiga saía engrolada e pastosa.
― O que... que
é que você pôs na nossa bebida? ― Lucí percebia em si um estado paradoxal de alarme
e letargia progressiva
― Doses
cavalares de midazolan, um sonífero poderoso. Provavelmente o mesmo que vocês
tinham posto na minha bebida. Como
foram primárias! Se deram ao trabalho de fazer um drinque diferente pra mim,
achando que o coroa babão não ia perceber nada. Só uma pergunta: como iriam se
livrar do meu corpo? ― ele ficava andando em volta delas, aumentando ainda mais
a vertigem que as dominava irresistivelmente.
― A gen... te
trouxe coletes de chumo, de chumbo... íamos te jogar no Alcoro... no,
Alcornocálices, nu, numa represa ― Jaque sentia a consciência se esvair.
― Ok, entendi.
Agora relaxem e se entreguem ao sono, vocês vão acordar em outro lugar. Fiquem
tranqüilas, assumo tudo a partir daqui.
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