domingo, 21 de dezembro de 2008

babuínos têm úlcera (zebras não)

rua mota paes
rua mata-pais
em pós
matar o país
ser vítima da própria verdade

Deus é o nome do problema
Gratis pro Deo
e também o problema do Nome
o paralelo moral

tudo cabe na palavra tudo
toda coisa na palavra coisa
Deus, uma das máscaras mortuárias do Louco
personagem necessário
do sonho
― máquina de torturar babuínos ―
aparelho de báscula
nos gradientes
fundo-figura
[que vão] do Desejo para
o Real
e vice versa

porque no princípio
era só o Princípio
(o Grande Arquivo)
Logos/Físis/Hilé
são Meta

Deus é o enigma d’A Mulher
mas não sabia de nada
em Sua feroz ignorância
Dele a mão invisível do mercado
de sujeitos modernos
orgulhos tribais
empresas transnacionais
― e também não sabia dos ativos inflados
nem do rodo que passa todo dia nas bordas
do Sistema

a que serve a eminência
ausente
da operação abstrata (que gera a)
produção simbólica (vendida pelo)
marketing fantasmático
uma vez que a regra do jogo
é:
fique vivo
ainda mais que a Deus e à Mãe
nunca se perdoa
de todo
exílio tão insensato
a vida?


sexta-feira, 19 de dezembro de 2008


onde não sei
onde não sou
onde não fui
e não estou

no arrastar das horas
quem dói mesmo
são os joelhos

mas espiando pela fresta
da vida que espera
já se pode ver um pouco
de verdade a granel

desmanchei um muro e fiz uma estátua

o sonho
o símbolo
a sombra
o susto

respire:
já passou
porque jamais houve

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

a vontade do grupo desperta a paixão do artificial


A tua vã glória, Zion, é princípio do ser global
o lírio da dominância hostil encarniça
telas iminentes sob a história View Master
e dobras retornos de potestades auto-engendradas exponencialmente
organismos de terror puro e sentimentalidade
carapinas e súditos do: “Vá e leia”
pululam em raios UV nos vácuos pânicos nos interlúdios
do economista celibatário

Zion, país evitável de cidades impossíveis
poderia eu louvar perante os inimigos teus tribunais da parole
as constelações do teu céu de sonoridades interruptas
que liderou psicologias & mitos & desligamentos
idênticos
és o pó do pó de
um dormir ruim
ou murro ou mato ou me morro

Tu matarás, tu serás morta e mortos serão teus assassinos
teu corpo físico devorará o corpo quântico
das hagiografias
negativas
incluindo as termináveis listas de seres miraculantes

Tudo somado, não sobra mais que um posto na Floresta dos Nomes
uma verdade que afirma o império duvidoso
da Palavra, sabendo a vida vaivém
do Inarticulável
e que no coração do circo
sempre cabe mais um palhaço
e, na tua forja, Zion, as Assembléias trapaceiam na liga, no peso, no amálgama,
da Coisa
se lhe roubam metade,
fazem dinheiro
se roubam um quinto,
fazem notícia
se roubam um milésimo,
fazem um reino

“Em cima do catarro
Tem um copo edipiano
Quem bebeu, morreu
O azar foi seu”

domingo, 14 de dezembro de 2008

CONTINUUM



Estacionou o carro após três horas e meia de viagem, os labradores dispararam uma algazarra de lambidas e pulos; os latidos ecoavam no braço de encosta coberto da mata densa que envolvia a casa e descia em declive abrupto até as franjas da praia. Manuela recolhia ao santuário das suas crises; uma semana isolada de gente e celular desligado seria, mais uma vez, suficiente para recuperá-la ― os sócios que segurassem os BOs na agência. O caseiro e a mulher estariam fora no final de semana: um feriado religioso caindo no sábado. Finados, talvez.
Que importa, agora só lhe importava mesmo preparar um dry martini decente, se largar na rede da varanda de frente para a vegetação, ouvindo o mar à distância. Balançando de leve, sem pressa para se entregar ao livro em suas mãos, meio embalada pelos esbarrões dos cachorros e o canto dos pássaros, meio desperta pela sensação gelada dos dedos que mergulhava no copo, ela recorda o ponto exato em que largou o texto. Os olhos encontram na página a última frase lida: “... os limites do seu destino tinham sido traçados pelo seu desejo.”. Poucos compreendiam, e muitos se admiravam, desta capacidade que tinha de ficar só.
As duas marcaram o encontro no alto do morro. Uma delas, na verdade Jéssica é um travesti, já está esperando no barraco abandonado; há poucos objetos na cena, a mesa bamba e sem cadeiras, a cama é um madeirite apoiado em pés improvisados de tijolo baianinho e a espuma verde manchada por cima. Um sagrado coração de Maria na parede. Chega a mocinha: jeans largo, tênis de lona colorido e blusa de alças ― o cabelo curto lhe dá um certo ar de tomboy ― ; ela repara que Jéssica está sangrando, faz menção de ajudar, esta retira a mão.
Manu estica seu braço pelas costas da rede, sentindo na mão a textura agradável do algodão cru contra a cabeça. A traveca desfaz o primeiro dos dois embrulhos que trouxe: um trinta e oito com a numeração raspada; abre o tambor, conta as balas, entrega-o à outra.
― Tó aí, amapô, a minha parte eu fiz ― chupava o sangue do corte produzindo um barulho agudo. ― Fiz isso daqui cortando a carne pra você. Entendeu o caminho que te expliquei?
― Sua grana. Deixa comigo; a trilha sai dos fundos do barraco, certo? ― Jéssica confirmou com um aceno, ela guardou o berro e o outro pacote numa pochete que usava atravessada no tronco franzino. Despediram-se em silêncio.
Saiu quase correndo pela mata para aproveitar o resto de luz do dia. Um suor acre e viscoso se empastava na pele e os mosquitos a atacavam sem dó, mas o pior era uma ridícula lembrança que se intrometia no pensamento, uma frase de circo, hoje tem marmelada?!, repetida pela mente a cada vez que a arma dentro da bolsa se chocava contra os peitos. Procurou afastar essa bobagem da cabeça para se concentrar no caminho e em cada etapa que deveria seguir. Os cães iam estar muito ocupados para atrapalhar. Sem criados. Atravessou a cerca passando por baixo, contornou então o terreno pelo lado oeste.
Subiu no alpendre e parou alguns instantes para se acalmar; o coração batia tão forte que acreditou que poderiam escutar suas pancadas violentas na casa vazia. Hoje tem marmelada? Caminhava pisando de leve o assoalho de tábuas corridas, observando as vigas enormes de madeira envernizada no telhado enquanto se aproximava apoiando a mão livre na balaustrada. Escurecia rápido. Engatilhou o revólver puxando o cão lentamente para não fazer barulho; como calculara, o alvo estava de costas, agora perfeitamente visível. O braço estendido para fora, dedilhava distraidamente os cordões da rede.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

a treva é quem desacerta as cores




o carro estava ali, parado, demorando
até que veio o apagão:
de madrugadinha, tomando este e mais dois quarteirões abaixo
um buraco de escuridão medonha
no meio da cidade;
foi no instante que entrei,
antes é preciso dizer que o camarada estava
do lado de lá da rua, à esquerda da minha guarita
e era um pretume sem falhas, grosso
igual piche,
daí que o clarão medroso da chama
não vencia a espessura da noite por toda
força que fizesse
mas era o bastante para graduar a dimensão dela,
como uma vela cria tons na sombra
ou como o negror da roça são trevas
de outra matéria das que temos aqui;
ele deve de ter acendido um isqueiro ou fósforo dentro do carro,
acontece que naquela situação
o ar se encheu de grãozinhos de um cinza
mofado
mas que esplendiam com todas as cores do arco íris
fagulhas ciscando a noite, azougues
semelhavam, tanto que foi o instinto que tive:
pisquei

domingo, 7 de dezembro de 2008

um rei é sempre a caça de outro rei




Mueni-Congo, Mobemba Muzinga (Mobemba Muzinga, Rei do Congo)

Na margem esquerda da foz do rio Congo os navegadores deixaram um padrão ― pilar composto de uma coluna circular na base, um bloco retangular com o Pavilhão das Quinas esculpido na pedra calcária e encimado por uma cruz de ferro ― no qual assinalavam o ano, “6681 da criação do mundo e 1482 do nascimento de Nosso Senhor Jesus”, bem como a posse daquelas terras a D. João II, o Príncipe Perfeito. O capitão da esquadra e escudeiro real Diogo Cão, navegou muitas milhas adentro do Congo ou Zaire, rio a que os portugueses chamariam Poderoso a justo título, já que vem a ser o segundo maior da África. Não acharam indícios de passagem, por terra ou água doce, para o Oceano Índico, nem penetraram os domínios do lendário rei cristão africano, o Preste João, mas estabeleceram proveitoso contato com a rainha Malele kya Nsi e o reino do Congo. Esta viagem serviria mais tarde de modelo a duas outras na ficção: na travessia do rio-continente mítico de O Coração das Trevas, romance de Joseph Conrad, como no Vietnã de Apocalypse Now, filme de Francis Coppola, é o ocidental, na pele do agente/coronel Kurtz, que vai além dos “limites das aspirações permitidas”. Na história, no entanto, é o poderoso herdeiro de um reino milenar, o Mani-Congo, o rei Mobemba Muzinga, quem perde a cabeça diante dos amindele, “baleias que vêm do mar”, ou vumbi, “cadáveres vivos”, que foi como os brancos pareceram então a seus súditos. Fosse por obra dos missionários dominicanos, fosse o cálculo político de quem queria se livrar de adversários, o soberano converteu-se ao cristianismo; Mobemba Muzinga, a quem D. Manuel, o Venturoso, trataria, na correspondência que passam a trocar, de “primo” e por quem será chamado de “irmão”, abjura seus antigos deuses, muda o próprio nome para D. Afonso, troca o da capital, Quibango, para São Salvador do Congo e solicita ao papa bênção apostólica. Quando D. Afonso-Mobemba morreu envenenado, seu poderio militar decaíra, seus domínios haviam encolhido geograficamente, a aristocracia congolesa tinha sido vendida para traficantes de escravos e, daí em diante, nunca mais um Mani-Congo voltou a exercer poder efetivo, nem desfrutar da felicidade de morrer na velhice ou na glória da morte em batalha.


Montezuma, México-Tenochtitlan Uei Tlatoani (literalmente: Montezuma, aquele que fala no México-Tenochtitlan)

À frente de 35 dos seus mais valorosos soldados, Mobemba Muzinga derrotou o exército de 3.000 do seu irmão Penzo Muzinga; depois de lhe cortar a cabeça, ofereceu o fígado e o coração aos guerreiros no banquete da vitória e, ainda manchado de sangue, subiu ao trono de ouro onde foi coroado, sorrindo ao povo como era a tradição dos seus antepassados. Naquele momento, num continente que viria a se chamar América, o imperador Montezuma fechava a cara; no calendário azteca, os tempos se avizinhavam do advento de estranhas profecias: os mexicanos contavam o tempo em ciclos de 52 anos, os quais dividiam em 4 séries, ou “cores”, de 13 anos de duração a que davam os nomes equivalentes a “Coelhos”, “Bambus”, “Pedras” e “Casas”. Exatamente como funcionaria um baralho de 4 naipes, sem coringas. O mundo em que viviam, o quarto desde a criação do universo, seria destruído pelo fogo, assim como dilúvios, terremotos e furacões haviam encerrado as eras anteriores; chegaria naquele fatídico quarto ano das casas do oitavo ciclo o deus do vento que sopraria o fogo exterminador, o temido Quetzalcoatl, a Serpente de Plumas Preciosas viria do leste na figura de “um homem de boa aparência, aspecto grave, pele e barba brancas, vestido com longa túnica branca”. Nesta época vivendo em Cuba, Hernan Cortês sonhava: arrancado da pobreza, via-se ricamente vestido e sendo servido por estrangeiros que lhe diziam “numa língua gentia, palavras honoríficas e de louvor”. Na câmara de audiências do seu palácio flutuante, Montezuma observa o objeto amarrado na cabeça de uma ave, “grande como uma águia”, capturada por pescadores no lago Iztapalapa, que tanto impressionaria os conquistadores espanhóis, e que dividia em duas ilhas a sede da belíssima capital do seu império. Era um espelho, redondo e muito polido, onde se desenrolavam imagens miríficas de homens chegando em grupos armados, montados sobre bichos desconhecidos; enquanto o imperador se virava para perguntar o que era aquilo e qual o significado daquelas visões a seus astrólogos e sacerdotes, o pássaro desapareceu. A 8 de novembro de 1519, dia particularmente funesto na astrologia azteca, no qual nasciam mulheres loucas e nigromantes assassinos, os temidos Tepupuxaqueirichos, Cortês cruzava, à frente de pouco mais de 380 homens e 12 cavalos, a ponte que dava acesso a Tenochtitlan. Os nobres senhores de Tetzuco, Teotihuacan, Tlacopan, Iztapalapa e Coyoacan estavam ricamente vestidos, mas descalços, como símbolo da sumissão a Montezuma e aos estrangeiros que lhes explicaram que vinham em nome de um Deus maior que todos, ao qual obedecia o imperador que governava a Espanha, novo dono daquelas terras. Inquiriram então sobre tal senhor, dono de tantas terras, e desse Deus, tão grande que se dizia único, ao que Cortês, de bom grado, os instruiu na doutrina cristã. Quetzalcoatl, a quem Cortês se referia como Sua Majestade Carlos V, lhes mandava a mais estranha das mensagens: de agora em diante, deveriam abandonar os deuses que exigiam deles homens vivos como alimento, por um deus vivo que era comido em sacrifício pelos homens.

sábado, 6 de dezembro de 2008

o livro de bolsa da mulher moderna...


Rainhas do Romance
Autoras best-sellers
Histórias consagradas


Romances Históricos
Medieval
Regência
Heroínas que desafiam a tradição
Guerreiros das Terras Altas
Nobres
Cavaleiros


Desejo
Emoção
Sedução
Família
Poder e negócios


Desejo Fuego
Romances modernos
Relações ardentes




Paixão Sexy
Romances contemporâneos e picantes
Cenários urbanos


Paixão
Cenários internacionais
Muito glamour


Destinos
Romance e suspense
Sagas. Trilogias.


Jessica
Sensualidade
Sofisticação
Heróis internacionais

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

de leveza são capazes diversos elementos, vários gases

rondou por horas

o tormento desde o telefonema

dela

chegou, finalmente, atrasado

rezando

para que já tivesse ido embora

então

teria uma desculpa para

sair por aí,

nenhuma mulher com o bom senso e o juízo

e o orgulho

no devido lugar, perderia a chance

seria o retorno à paz

e ao desespero

àquilo que mais estava acostumado:

a infelicidade familiar traduzida

pelo gosto de nada na boca, involuntária,

a saliva

começou a descer-lhe

pela carne,

ganchos de ferro arrancavam

nacos de pele, tufos, fios soltos,

(a libra de Shylock)

o apartamento em polvorosa

uma meia de náilon pendurada numa cadeira

como o rabo de um gato

que não pode mais

sorrir