segunda-feira, 30 de novembro de 2009

mundo em latim queria apenas dizer ‘ornamento’




eu ventoiiiiiiina nuvemiiiiiisou passo


no passoiiiiiiisou ventoiiiiiieu nuvem


sou nuvemiiiieu passoiiiiiiiino vento


mais
nada

domingo, 29 de novembro de 2009

Haikaí, ai-ai



quem caiu fui eu
meu mundo fez plof!
vaidade, moral
tudim, levou chão

híbris & em pós
nêmesis, pois é:
quem os deuses tão
maldiz, sete nós

ganha, gel anti
germe, gaze e
molho forçado
ponto-falso, ui!

(Que lindo
Capacete de pena
Que tem a
Cabocla Jurema )

pero que las hay, las hay

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

António Lobo Antunes



"As palmeiras inclinavam os quadris para o nascente como grandes girassóis inesperados"
(A. Lobo Antunes, em "Conhecimento do Inferno" Alfaguara editora, Rio, 1980)

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

vestindo a nudez da escuridão por uma efemeridade longa e breve


[Tristeza, tristeza do sonoceano, por mais que a ignoremos]

não consigo fazer haikais
nem poesia digital
castelo de alusões/floresta de espelhos
e mais:
nunca me envolveria com peixes
que viram plantas
jamais
abriria a boca
p’ra que fugisse o absoluto
(em gotas ornamentais)


[o mundo desaparece. ascensão da razão]

mas nem tudo é mofino:
escrevo sem foco me amparo
ora sílvio ora joão
som-literatura
adotei a não-técnica
como indisciplina
confesso discretos vícios
entre fissura
e confusão


[todos têm seu medo especial, misturado a técnicas anti-paixão]

fui condenado ao estelionato estético
a mão-leve do diletante autônomo
e descuidista
tenho vergonha alheia do meu ridículo
de entranhar o esquisito
no estranho
hesito
vou de singular a leviano anônimo

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Haikai com fome



abutre alado
prometeu acorrentado
comer meu fígado

(Edmar Oliveira)
____________________
© Foto de Ke
vin Carter. Abutre aguarda morte de criança no Sudão.


terça-feira, 24 de novembro de 2009

emma thomas



até que seria fácil ser um grande canalha
mas sempre seria preciso
ser grande
ser irmão e irmã adotar gatos fazer versos
isso sim
são coisas grandes demais
querida Sissi desista
de saber si
ou de querer esclarecer
como é e como foi pra mamãe
(Mystérios Gozozos)
funke-se quem puder
baby
deixe-a perder a mente
e virar bicho e voltar a ter cheiros fortes
e novos
e só lembrar do mais simples dos antigos
jogos
porque se é bicho também tem aquela máquina
de lembrar e esquecer fantasmas
afinal foi você mesma que disse
que nunca vou poder parar
de fugir
e me explicou que a fuga é uma arte
de parir umbigos
voa quem puxar por eles e sair do chão
uma vez que quem sonha que voa
está com medo (dos vivos)
e que é por isso que me perco e acerco do centro
em deslocamento
como é certo que todo aquele que aceita dormir
no teu sexo-restaurante
deve ser íntima
vítima da própria verdade
e mesmo que não fosse assim me diga
¿como poderia saber que jamais
em ti
ia encontrar paz
e seguiria assim
andariego
?
sou sempre precário sempre esboço
somente um moço
de recados
esforçado
boçal
e

haikai ao lago


A flor cai no lago

Desliza, bela, singela,

Afago que afoga...

(Edmar)

foto do flickr de "Míamalu"

domingo, 22 de novembro de 2009

a cama de Gonçalo Pires


Onde si rellatam os factos tais como foram sertificados nestes autos aquando da requisitação de huma cama na villa de são paullo durante visita de s. exa. o ouvidor real e da tomada da quall cama polos ofisiais da camara da sobredita villa.

Só o tempo mostra às vezes todo o bem que alguém fez, já o mal se percebe logo de cara. Naquela época o Brasil, colonizado por portugueses, holandeses e franceses, integrava os domínios dos reis Habsburgos conhecidos como os 3 Filipes de Espanha. Expandia-se a ocupação do país na direção do interior, vilas como São Paulo de Piratininga cresciam impulsionadas por uma gente orgulhosa e bravia. Era agosto de 1620.

De modo a não passarem vergonha com o rústico mobiliário da Casa da Câmara, os “homens bons” da vila de São Paulo discutem a melhor forma de acomodar o Ouvidor Amâncio Rebêlo Coelho, incumbido de aplicar na colônia os rigorosos capítulos das Ordenações de Sua Majestade. O problema angustioso: não havia leitos decentes em toda a comarca e as notícias davam conta de que a liteira com redes de abrolho que transladava o alto dignitário já chegara a Cubatão.

Dormia-se in illo tempore segundo critérios étnicos: os brancos em camas, os negros em catres ou no duro chão da senzala e em redes os índios. Porém, as camas que serviam à classe senhorial paulistana não passavam de caixotes feitos na terra, mal se distinguindo das enxergas da escravaria. Seria um desdouro, uma incivilidade a manchar o nome e a fama da vila, se o magistrado itinerante tivesse de repousar os costados numa cama de negros!

Até que alguém se lembra da cama de Gonçalo Pires, uma bela cama de madeira carpintejada e coberta de rico dossel que ele trouxera da metrópole. Três expeditos vereadores vão requisitá-la na casa do dono que recusa todas as propostas, não empresta, não vende, não aluga e não cede a nenhum argumento. E ainda acrescenta: o senhor ouvidor que durma onde quiser, mas não na minha cama.

Diante da obstinada recusa, o juiz e o alcaide da vila mandam uma força municipal composta de dois oficiais armados com arcabuzes e seis índios com bordunas, machetes e cordas. Dois cabras são necessários para imobilizar um indignado Gonçalo Pires enquanto os índios desarmam a cama e a levam com o sobrecéu, os cobertores e lençóis de algodão rumo à Casa da Câmara, onde no dia seguinte iria dar descanso às fatigadas banhas do senhor Ouvidor.

Longos sete anos se passarão numa batalha jurídica na qual a câmara notifica, oferece compensações financeiras, ameaça, multa, roga e Gonçalo Pires sequer se digna a responder às mais altas autoridades da circunscrição. Amigos e conhecidos contavam que, perguntado, “... o quall respondeo que lha dessen como lha tomaram, que então a receberia”. Tal como o rio de Heráclito, que nunca é o mesmo a cada vez que se entra, o solerte Gonçalo sabia que aquela não era mais a sua cama.

ligo louco só pra ouvir a voz dela (homenagem ao poeta Gregório Delgado)

Os Mil Braços da Deusa da Misericórdia

não preciso do dinheiro
me fodo sozinho sei
amolar meio mundo mídia
vesgo vago meu amor via

somos parecidos desiguais
desejo beijo da lôca
doenteucorpoemeu
de amor incompleto
sofronésis sofroeu

CORPOTEU
POEMATEU
SOLIDÃO SE NOTA


grita o gregório
delgado pai de deus
(como pôde simplesmente assim ir
se quem criou)

fui eu(s)?



Eu E Minha Sombra Sufocada Pela Grande Sombra







Pessoa mediana




Eu cresci e virei uma pessoa mediana

Não entrei direto na USP, como previam
Não virei uma revelação musical, como torciam

Meu carro está batido
Eu ponho roupa no varal
Não vejo mais filmes iranianos
E eu não tenho passaporte

Fiz do inesperado meu trunfo
e ganhei a lucidez da visão
de que o perverso
estava no mapa colorido e 3D que me havia sido entregue.











Agora, só o vento.

sábado, 21 de novembro de 2009

casablanca



Meus olhos em águas de te ver partir

Enevoam tua imagem na minha lembrança

Te quero amiga sem te ver sofrer

Te quero sempre sem poder te ter

Conservo teus olhos nos olhares meus

É por ti gostar que te quero embora...

Embora chore por não ter-te amar-te amor-te morrer

Nos versos do poeta triste

(Edmar Oliveira)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

este é de quando tinha 17 anos




você tem


olhos de gato,
bicho do mato

corpo de pêra,
bicho da seda

marcas de rato,
maroto, ingrato

beijo de amora,
cigana espanhola

dentes de cão,
cara de não

sorriso de ave,
astro & nave

pés de centopéia,
feitiço de velha

escamas de peixe,
nunca me deixe

pêlos de abelha,
crista vermelha

asas de morcego,
ciúme, apego

mãos de lagosta,
segredos de ostra


e disse pra mim,
cai fora do meu jardim!

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

domingo, 15 de novembro de 2009

DASDOIDA



a primeira lei da natureza é a tolerância, já que todos nós temos uma porção de erros e fraquezas
Voltaire

sábado, 14 de novembro de 2009

você tem razão


eu olho
que tu vejas
onde ele
déja viu

iconoclássica bobagem de quem não tem
cem paus
bilhete único, vale-transporte ou a grana
do busão

o microvestido causa tremendo
rebuliço
agora escrevo o amanhã que já não sei
se há
se houve, se haveria e se será
à vera

ao ir-me indo vou
pasmo
porque o tesão não acha mais a carne, a rima
& a solução

tomo o elevador visionário (do shopping)
parei
de parar, de balançar cem mil vezes o barco
bêbado
da paixão em bicas jorrando ao céu
seus rufos

de que adianta construir pontes entre
os mistérios
e seguir caminhamando
sem sustos?

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

a história é uma visão-pensamento do que aconteceu

foto de Alex Branco

Queridos tios V. e R.:

Depois de pesar muitos prós e contras, resolvi que era hora de falar com vocês da perda que nos atingiu recentemente, o trágico falecimento da tia L. Preocupava-me a princípio se não seria pior ficar a remexer no que talvez lhes dê melhor azo a oração, perdão e esquecimento, por outro lado, me angustiava com a atitude omissa numa hora delicada da vida familiar. Se não encontrarem consolo nestas palavras, que vos fique ao menos a intenção dele; melhor achei correr o risco do que silenciar com quem sempre foi generoso e acolhedor para comigo e os meus.

Na vida profissional e pessoal passei por diversas vezes a situação de perder o convívio de alguém que escolheu a morte voluntária, o auto-sacrifício. Isto me ensinou alguma coisa? Sim e não, já que nem todas as lições da vida são dizíveis, quer dizer, não vos saberia aqui expressar o muito ou pouco que aprendi, mas acabei por desenvolver uma certa maneira (instintiva) de agir quando as situações concretas sobrevêm. Há um tipo de conhecimento que não acessa o juízo: está em nós como que tatuado ou marcado a ferro, cosido às tripas.

No entanto, o mais árduo, incerto ― e ainda inacabado ―, aprendizado diz respeito a não julgar. De tempos em tempos preciso que me lembrem que sou apenas (e na melhor das hipóteses) um simples curador, não um magistrado. Para começar a saber julgar os outros e a mim mesmo precisaria talvez viver toda uma outra vida de novo ― e não estou certo de que alcançasse grandes resultados. A passagem dos anos na janela da profissão me ensinou que o conhecimento é tanto mais precário quanto mais se aproxima da mente e dos sentimentos das pessoas. Mesmo com todas as técnicas terapêuticas, avanços científicos e pílulas, o sofrimento humano ainda é vastamente indomável. Acredito que a tia fez o que fez porque tinha esgotado todos os seus recursos contra a dor de viver.

Dizem que há no universo uma radiação que veio da explosão inicial que originou estrelas, galáxias e buracos negros, o chamado “ruído de fundo” do cosmos. Conosco se dá o mesmo: desde o nascimento temos que lidar com a falta, falta comida, falta água, falta ar, falta amor. Tudo isso precisamos doravante obter do mundo, e é a dor, o constante ruído de fundo da necessidade, que nos move em busca do que falta. A dor de existir não é uma abstração de poetas, é coisa a que todos devemos nos habituar desde o berço, algo como um veludo negro que dá realce às jóias raras da nossa alegria.

Podemos comparar esta dor fundamental com os zumbidos de ouvido, que pioram com o silêncio e a escuridão. Mas que fique bem claro e assente: esta treva silenciosa não reflete a solidão que advém do abandono da sociedade, da família ou dos amigos, é antes efeito de um desterro da alma, o abandono de quem está intimamente perdido de si mesmo.

O suicídio é um crime sem criminoso, um crime contra a vida que deixa culpados os que não morreram. Quero poder lembrar da tia L. sem culpa, até porque todas as memórias que tenho dela são de uma pessoa viva, estridentemente viva, retumbante em suas opiniões e posições políticas, uma mulher bonita, passional e cheia de contradições (como todos nós somos, aliás). L.R.F. foi muitas coisas enquanto viveu e muitas continuará sendo enquanto viverem os que a conhecem e amam; seu gesto final não tem o poder de a resumir. Não há de ser o último acorde que definirá uma sinfonia.

Passei a infância escutando dos adultos o quanto era parecido com ela nos menores detalhes do rosto, do jeito, do caráter; minha avó materna me chamava de “L.inho”, e tenho disso muito, muito orgulho. Se há uma coisa de que não sofro é de vergonha ou mágoa das minhas raízes, reconheço em todos aqueles, familiares ou não, amigos e inimigos que fizeram parte da minha biografia, a parcela que depositaram no amontoado de partes e restos que sou hoje. Afirmo sem pudor a minha história, sou feito de tudo que vivi e de todos que passaram, passam e passarão na minha vida.

A grande riqueza da vida são as pessoas que amamos verdadeiramente, a grande tristeza da vida é que perdemos essas pessoas, o grande consolo é que o amor fica ― tudo passa com o tempo, só as obras do amor permanecem em sua fragilidade pertinaz. Recebam um beijo carinhoso do sobrinho que os ama,

M.

Claudinha


Repete o bordão
A frase, o machado
Risca o chão
Nem pisca
Não
É não e acabou


Encolhe-se num canto
Pranto, a fúria da mãe
A despedaçar a tua casa
A virar tua mesa
Os pezinhos delicados correm
Tentando evitar os cacos de louça
Mas não conseguem
Nunca conseguiram


O refúgio no amado
Equilíbrio
Tranquilidade
Sofreguidão
Tatuados a fogo na perna
Pra sempre
Mas pra sempre
Não pode ser pra sempre
E isso dói
De esvaziar o intestino
De sangrar de raiva


De tanto achar que a parede
Não acaba
Acaba convencida

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

sábado, 7 de novembro de 2009

as moscas do tempo gostam de uma flecha



time flies
like an arrow
I dwelt
upon
thy knee
the line
of the thigh
thy back
the neckbone
arms pressing together
the outer side of fine
little breasts
I’ve got stuck
worshipping an idle
accentuated
body
exaggerated by disease
and rendered twice
over body
it was something in the highest degree
fleeting and tenuous
a thought
a delusion
the frightful
infinitely alluring
dream
whose unconscious questioning
of the universe
received no answer
save
a hollow silence