sexta-feira, 30 de outubro de 2009
DRAGÃO OCIDENTAL PADRÃO
Antes da excomunhão, os papas costumam condenar ao “silêncio obsequioso”,
que foi o que você fez comigo, sem tirar nem por,
usando palavras neutras e sonsas de manual de auto-ajuda
― é o próprio inferno, penso no que você me disse o dia inteiro:
“Esquece, ou você vai acabar me odiando, não posso mais ficar com você”
não dá, porra, sua ausência se alastrou como uma praga
dentro da minha cabeça, uma pústula inchada e vazia
meu apartamento parece um estádio de futebol, calado, imenso,
e pelas regras do jogo que jogávamos não posso reclamar,
pelas suas malditas regras eu posso ficar louco,
virado no cão, mas sempre quieto, digno e produtivo
devo aceitar o fim com maturidade (quase uma libertação),
chorar durante sete semanas frias e, ao fim, levantar o luto
virar a página, fazer a fila andar, não é assim?
cair na balada, ligar para os amigos, ativar a agenda e...
terminar a noite ligando bêbado para uma mensagem gravada
mas isto não vai ficar assim, vou te denunciar pro Denarc,
espalhar que você planta maconha no quintal, que vende crack pra velhinhas,
vou me suicidar no Facebook, divulgar nossas fotos na Praia do Sono, vou
vou nada!, vou o caralho!, vou é ficar aqui ruminando as suas pérolas:
“Quando o amor acaba, é como quando acaba a bebida da festa:
acende a luz, junta o lixo e vai embora”
como a vida é simples pra você, não?
acontece que eu te perdi, é tipo uma morte, sabia?
acontece que a vida acaba, mas a morte não
é como se você estivesse morta só pra mim,
só eu não posso te escrever, encontrar, falar e não adianta tentar explicar
NINGUÉM PODE ENTENDER O QUE EU PERDI (EM/COM) VOCÊ
e já que você sempre carrega frases tãntricas/tétricas
na algibeira que explicam toda e qualquer situação,
vou te lembrar uma historinha budista:
“Caminhava Buda por uma estrada quando
avistou um cachorro devorado pelos vermes,
encheu-se então o Buda de infinita compaixão
pelo cão e resolveu livrá-lo dos carrapatos;
retornava o Iluminado ao seu caminho, quando
foi tomado o seu coração de infinita compaixão
por eles, voltou atrás, cortou um pedaço da
própria carne e deu-a aos vermes.”
Você só não tem pena do sanguessuga que nunca deixei de
Ser
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
o perfume tragicômico da carne
ah, minh’alma mal
acabada
sombra de um maldormido
sonho
por fora risonha e branca
trágica e vermelha
por dentro
ah, minha terra querida
nação moribunda
como é poética a imagem do moço
encontrado
morto dentro do carrinho
de supermercado
quanto vale, ou é por quilo?
amigos, que graça nascer no desespero resignado
de resignação desesperada
aqui o sol não morre nunca
nem nasce o mar sem plumas
berço e tumba
da nossa vergonha (coberta de asas)
libidinal nudez
ah, que idiota sou
compondo versos de água
elegias da neblina
elogios ao rio escuro de água
dormente
esse rio de noites estreladas
e águas cobertas de luar
e cadáveres desovados
meu canto é café coado
na calcinha
canto a luz do céu
de Suely
este meu coração funâmbulo
que desliza por rios
de matéria choca
que sofre e sonha e reza
para formas espectrais
a imperfeição de que tudo é feito
é o que o teu corpo solidário
derrama em mim
nas coisas
por que
passa
pois igual às perifas e favelas
morros, quebradas e montes aprazíveis
da minha terra
me sinto irmão dos que estão vivos
e dos mortos
órfão
humano só sou na dor
domingo, 18 de outubro de 2009
eu tenho a mania de ouvir poesia (no que os outros dizem)
sou irremediavelmente autodidata
leio com o estômago
escrevo com os ouvidos
apago frases incompreensíveis
com o fígado
sou brasileiro
natural de São Paulo
de Luanda
malandro-agulha
PhD em cultura
inútil
anoto frases dos outros
no ponto de ônibus
metrô, trem, lotação
enquanto espero na faixa
ou tomo café no balcão
leio o jornal da padoca
pergunto que horas
são
microculto em taras, trívia
patacoadas e perversão
macroignorante da vida
burguêsmente me assusto
com a bananalidade
do mel
adormeci e acordei
em Mumbuca, Tocantins
onde a doutora em paciência diz:
“A gente se formou em ter filhos
e eleger candidatos”
na teleaula do gratuito horário eleitoral
meu diploma é título
de otário
acadêmico da votação
formado em
desigualdade
violência
e beleza natural
sábado, 17 de outubro de 2009
terça-feira, 13 de outubro de 2009
anatomia patológica
ninguém nasce humano
torna-se
o homem não existe
é inventado
(cópia da máscara de outra cópia)
o que há é o homo sapiens
assassino
voraz
estuprador
sob a seda, a escapar dos punhos de renda
o orangotango
consumidor/explorador/detonador de tudo aquilo
que é e que não é
self
sem essa
de socialismo ou barbárie
sem essa
da natureza essencialmente má
sem essa
do selvagem naturalmente bom
isenção de impostos
para
a confissão agnóstica
já!
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
o Demônio de Maxwell
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
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