domingo, 18 de outubro de 2009

eu tenho a mania de ouvir poesia (no que os outros dizem)



sou irremediavelmente autodidata
leio com o estômago
escrevo com os ouvidos
apago frases incompreensíveis
com o fígado

sou brasileiro
natural de São Paulo
de Luanda
malandro-agulha
PhD em cultura
inútil

anoto frases dos outros
no ponto de ônibus
metrô, trem, lotação
enquanto espero na faixa
ou tomo café no balcão
leio o jornal da padoca
pergunto que horas
são

microculto em taras, trívia
patacoadas e perversão
macroignorante da vida
burguêsmente me assusto
com a bananalidade
do mel

adormeci e acordei
em Mumbuca, Tocantins
onde a doutora em paciência diz:
“A gente se formou em ter filhos
e eleger candidatos”

na teleaula do gratuito horário eleitoral
meu diploma é título
de otário
acadêmico da votação
formado em
desigualdade
violência
e beleza natural

8 comentários:

Climacus disse...

quando alguém morria na Atenas de Platão, chamavam as Hésykhides ou as Eumenides (nada de Erínias não) as silenciosas. Elas não faziam nada, só escutavam, e com elas presentes em frente ao corpo morto, reinava o silêncio. Ocorre que essa palavra, hésykhía, tem outros sentidos: solidão, repouso e serenidade. Da escuta das Hésykhides, surge a poesia do mundo que une gregos e troianos, mortos e vivos, uns filósofos acham que desse silêncio nasce o lógos fundamental, outros, os céticos, acham que a união está no silêncio mesmo, um silêncio poético.

Anônimo disse...

Me fez lembrar de um novo serviço lançado em Portugal, é um tal de
Disk Finados. Vc telefona e ouve um minuto de silêncio!

Dalva M. Ferreira disse...

Esse foi no fígado! Seu eu tivesse um Nobel sobrando...

filipe com i disse...

solidão, repouso e serenidade... só mesmo no Disk Finados da terrinha, mas insisto: quero a sorte de um amor tranqüilo.

angela disse...

Esse poema é sincero e nem me venha com a conversa do Pessoa...sobre o fingidor.
Gostei muito, mas me conte o que é um malandro-agulha, perdi essa lição.
Me contento com um amor, seja ele como for.
As exéquias deixo pra depois. Agora é só cantar parabéns.

Anônimo disse...

Não sei nada de malandro, mas acho que deve ser aquele anda sempre com uma bala na agulha...na arma sabe...sei lá tbm.

filipe com i disse...

malandro-agulha: aquele que só leva no buraco... desculpem a gíria antiga, mas é que o malandro aposentou a navalha (que dizer então da agulha da bala).

angela disse...

Eu também sou antiga, mas a giria é da época de minha mãe...mas até que é usada vez por outra, é que não me lembrava do significado. Agora não esqueço mais....acho rs