Aldeia dos Quatro Montes
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A Aldeia dos Quatro Montes era uma pequena Vila...
(Para quem se questionar sobre esta discrepância entre Aldeia e Vila, aviso desde já que não tenho explicação para tal fenómeno… Talvez fosse a mania das grandezas, muito em voga naqueles tempos.)
Dizia eu que a Aldeia dos Quatro Montes é uma pequena Vila, perdida no interior.
Já tinha tido o seu tempo áureo, arrastando-se agora numa luta insana para fugir ao esquecimento.
A vida corria pacatamente…
Numa noite de Verão, em que a animação aumentava graças aos emigrantes que ali passavam as suas férias, um dos poucos cruzamentos perigosos da terra foi palco de um acidente entre dois carros.
Tratou-se mais de chapa batida, sem feridos, excepto um corte numa das mãos de um dos condutores… Nada que merecesse grandes preocupações.
No dia seguinte, o acidente foi tema de conversa nos bancos do jardim, nas mesas dos cafés e, até, na homília da missa da tarde.
Porque estes jovens de hoje são todos uns irresponsáveis…
Olha, que bebam água… E mesmo essa com cautela… que a nossa água tem muito grau!
Tinha que ser… Eu não vos dizia que naquele cruzamento ainda se há-de matar alguém?
As poucas vozes mais sensatas bem tentavam chamar a atenção para o facto de aquele ser o primeiro acidente em muitos anos mas, convenhamos, ninguém queria dar ouvidos a esse tipo de conversa…
Então, agora que tínhamos motivo para dar à língua, vinha alguém dizer que o assunto não tinha importância? Era o que faltava!
E o assunto foi ganhando amplitude…
O jornal local, que saía uma vez por mês, lá conseguiu trazer uma imagem dos dois carros, na primeira página. Os carros já estavam na oficina de bate-chapas do Alfredo. O director, e único jornalista do mensário, informava os distintos leitores de que o arranjo seria de pouca monta e o serviço seria rapidamente realizado pelas competentes mãos dos exímios trabalhadores da Oficina Carvalho (passe a publicidade… dizia o director).
Em editorial, o director perguntava se os poderes públicos estavam atentos ao que se passava na Vila… Na mesma página, surgia uma entrevista ao administrador da terra em que Sua Excelência se afirmava preocupado, afirmando que iria exigir (este “exigir” estava em negrito bem carregado) a quem de direito que se reforçasse o policiamento nas vias, principalmente, no Verão.
No final da página, numa caixa, o director do jornal fazia eco das preocupações de muitos dos habitantes da Aldeia dos Quatro Montes.
“ A nossa Vila merece mais… Basta olhar para os nossos vizinhos e perceber que estamos a ficar para trás…”
E terminava com um afagozinho ao poder local:
“Queremos acreditar que a nossa administração tudo fará para resolver este magno problema… Não será, certamente, por falta de empenho do senhor Administrador que este assunto morrerá no olvido.”
O senhor director usava uma linguagem rebuscada, quase rococó… Dizia ele que um jornal também serve para instruir!
Habitualmente, o “Mensageiro dos Quatro Montes” era mais lido por causa dos anúncios do Cartório do que pelas poucas notícias que lá vinham… No entanto, esta edição foi um sucesso…
Quem passava pelo senhor Administrador cumprimentava-o pela excelente entrevista e pedia-lhe que exigisse mesmo o reforço do policiamento.
Até porque, continuavam eles, qualquer dia ainda nos fecham o posto da Guarda… Já só lá estão meia dúzia de guardas, exageravam…
Sua Excelência agradecia os cumprimentos e reafirmava a sua firme intenção…
Até que um dia, numa conversa com um dos seus colaboradores, lhe surgiu uma ideia…
(Estória, em capítulos semanais, aos Domingos)
Aviso: qualquer semelhança com nomes ou situações reais será mera coincidência... Esta é uma obra de ficção, resultado da pouca imaginação do autor.
3 comentários:
Que bom ler suas histórias "sem imaginação" e cheia de coincidências..rs Impressão minha ou vi, um tempo atrás, uma foto de acidente em um cruzamento de sua cidade?
Adorei, estou aguardando o desenrolar.
beijos
hahaha, adorei essa de "com muito grau"; aguardo fremente a continuação Joseph!
grato pelos coments...
próximo Cap. Domingo à noite...
abs
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