Estava eu a ler o jornal, quando entraram o Hélder e o Rui.
- Senhora Felisberta, dois cafezinhos, se faz favor.
Sentaram-se na minha mesa.
- Então como é que foi a jantarada ontem?, perguntei eu ao Hélder.
Ele acabou de pôr o açúcar no café:
- Do melhor que há… ainda bem que o Francês decidiu abrir um restaurante. A mulher dele tem jeito prá coisa.
- E o que se come?
- Olha para começar o Prof. Pereira pediu umas entradas. Eu fiquei meio sem jeito, que não percebo nada dessas etiquetas e disse que podia ser igual para mim. E lá vieram as entradas.
Quando vi uns camarõezinhos até tive que engolir um suspiro. Já imaginaste se me traziam umas coxinhas de rã ou uns caracóis?
- Quanto às coxas de rã… nunca comi. Se calha até era capaz de provar. Agora os caracóis… Não me digas que nunca provaste?
- Nã… só de pensar naquela coisa gosmenta que eles deixam ao andar…
- Pois… eu já comi quando fui a Lisboa e bem que me souberam. Mas adiante… que mais…
- Depois é que foi o pior… Então, vocês estão a ver… Veio a moçita que trabalha lá a servir às mesas, tirou os pratinhos dos camarões mais os molhos e logo a seguir traz duas taças, uma em cada pratinho. Pôs uma ao Professor e outra à minha frente. Eu olhei para aquilo e o que é vejo? A mim parecia-me água… Água mesmo, sem mais nada! Nem tugi nem mugi! Continuei na conversa a ver o que é que ele fazia… Mas nada! Às tantas lá perdi a vergonha e perguntei-lhe se aquilo era alguma sopa francesa. Ele olhou para mim muito sério e perguntou-me se eu nunca tinha provado o consommé à francesa. Lá lhe disse que não, que nunca tinha provado esse tal de consommé ou lá como é que ele falou… Que eu de francês não percebo nada, como sabes. Ele então disse-me que era uma sopa refinada. Olhei para os talheres e como não vi nenhuma colher ia a chamar a empregada quando o Professor me disse:
- Hélder… o consommé bebe-se… Pega-se na taça e bebe-se.
- Oh Professor mas isto é bom?
- Ora prove e logo me dirá!
Eu pego na taça e, coisa estranha, estava fria.
- Então… vamos lá. Prove!
Lá dei um golito. Porra lá para o consommé! Aquilo sabia a água… água fria sem tempero nem nada… nem um grãozito de sal, nadinha! Águinha pura da torneira!
O Professor continuava a olhar para mim como se estivesse à espera que eu desse a minha sentença sobre aquela coisa. Lá me armei em fino e fui bebendo aos golitos… Ainda dei uns estalos de língua como se me estivesse a saber muito bem e tudo.
Quando acabei o Professor disse-me:
- Agora para preparar a boca para o próximo prato, você tem de chupar esses dois gomos de limão que estão aí nesse pratinho…
Quando o Hélder acabou de dizer isto, o Rui começa a rir a bandeiras despregadas no que foi seguido por mim e mais uns bacanos que estavam na mesa ao lado e também estavam interessados em saber como é que era o novo restaurante.
- Ó Hélder… o Prof. Pereira bem ta pregou!
- Que é que estás para aí a dizer?
- A água e o limão eram para lavares as mãos, para tirar o cheiro do marisco!
O Hélder ficou a olhar para ele.
- Ai o malandro do Professor! Por isso é que ele deu uma desculpa esfarrapada para não comer a dele!
7 comentários:
hahahaha, muito fino esse professor! que minestra amarga essa do Hélder; obrigado José, a sua bem temperada prosa não é como a "sopa". (ainda estou a rir)
Conta a estória com muita picardia.
Ri bastante.
Há gente que deve desconfiar primeiro... mesmo quando vem de um professor!
grato pelos comments.
ps: esta estória aconteceu mesmo! nomes e localização alterados para preservação do orgulho ferido dos reais intervenientes.
abs
Deixa eu ficar beeeeem quietinha. Mas, cá entre nós, não parece piada de português?! Coitadinho...
Cara Dalva,
é piada de portuga mesmo.
Mas, digamos assim, é piada aplicável a todo e qualquer um que pretenda se armar em fino... género novo rico e outros espécimes deslumbrados.
grato pelo comment.
abs
Esta foi bem gira! O que eu me ri quando a ouvi contar...:))))))
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