domingo, 19 de dezembro de 2010

Aldeia dos 4 Montes - Cap. 19

Aldeia dos Quatro Montes



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19

O Senhor Director sugeriu que se sentassem todos na mesa junto à grande vitrina que dava para o Largo da República.
Ana Luísa e António Augusto pediram, também, café. O Senhor Director, vendo Pedro a tomar um Favaios, pediu a Salústrio que deixasse o café para depois e alinhou num cálice daquele moscatel.
- Então… Que me dizem à cerimónia…?
- O senhor Director conhece bem a peça…, respondeu Pedro, referindo-se a Sua Excelência.
- Conhecer… conheço! Mas, hoje, deixou-me, digamos assim…, deixou-me meio surpreendido! Não esperava que Sua Excelência estivesse tão a par das novas tecnologias! Sensores, avisadores sonoros…
Ana Luísa sorriu e baixou os olhos.
- Pois, eu acho que Sua Excelência esteve muito bem!, disse António Augusto. Já que se vai fazer um investimento destes, ao menos, que se faça bem logo de uma vez. Não é assim, caro Engenheiro?
Pedro ainda estava a tentar digerir a jogada de Sua Excelência.
- Quanto a esse aspecto, tenho de concordar. Seria um contra-senso implantar aqui em 4 Montes alguma coisa que já estivesse desactualizada. E, honra seja feita a Sua Excelência, fiquei agradavelmente surpreendido com a abertura de espírito do nosso administrador…
- Abertura de espírito…? Não estará a exagerar, caro Pedro?, disse o Senhor Director com um certo ar de espanto.
Ana Luísa e António Augusto também não estavam a perceber aonde Pedro queria chegar.
- Bom… Acho que ouvimos todos Sua Excelência dizer que estaria, completamente, disponível para ouvir todas as sugestões para melhorar o funcionamento…
O Senhor Director atalhou…
- Ah!... Então refere-se a isso? Pois olhe que eu não dei grande valia a essa afirmação… Não faz parte do ADN de Sua Excelência dar ouvidos a sugestões…
- Por isso mesmo… Gostei muito de ouvir Sua Excelência manifestar um certo… uma certa humildade!
António Augusto e o Senhor Director fixaram o olhar em Pedro. Havia ali qualquer coisa que não batia certo… Sua Excelência não era, exactamente, conhecido como pessoa que desse importância ao que os outros diziam. Principalmente, se se tratasse de questionar algo que a administração tivesse executado.
O Senhor Director não se conteve.
- Você acredita, mesmo…, nisso?
Pedro demorou a responder.
- Não…! E é por isso que toda esta encenação me causa engulhos!
Ana Luísa já começava a estar farta de tanta conversa sobre o assunto. Tanta coisa por causa de uns meros semáforos… As terras pequenas valorizavam demasiado algo que, numa qualquer cidadezinha, seria de somenos importância.
- Desculpem dar o meu palpite. Porque é tão importante tentar descobrir as intenções de Sua Excelência?
Pedro ia responder… Depois, pensado melhor, deu uma gargalhada.
- Pois… Tem toda a razão! Há tão pouco tempo que voltei a 4 Montes e já me estou a deixar infectar pelo vírus da pequenez… Tem toda a razão! O sistema de regulação de tráfego, como faz questão de o designar aqui o Senhor Director, que se dane! Por falar nisso… Senhor Director, reparou que Sua Excelência usou, pelo menos um par de vezes, esse termo? Vai ter que lhe cobrar os direitos de autor!
A boa disposição instalou-se à volta da mesa.
………
Pelas duas da tarde, no cruzamento dos semáforos, havia muito pouco movimento. Já nada restava que pudesse, a quem não estivesse a par da inauguração, dar indicação de que, ali, houvera uma festa, com petiscos e tudo.
Os semáforos estavam regulados para manter aberto o sinal verde para quem circulasse na Rua da Boavista. Quem se aproximasse pela Rua da Escola, era detectado pelos sensores e activava a transição para abrir o sinal verde. Os peões tinham à sua disposição um botãozinho verde que, depois de carregado, fazia abrir o sinal verde para que pudessem atravessar a rua. As passadeiras estavam imaculadamente brancas…
O Ti Zé do Quartilho tinha-se encostado ao muro do Lar, bem na esquina das duas ruas.
Rua da Boavista… sinal verde.
Rua da Escola… sinal vermelho.
Aproximou-se um carro, descendo a Rua da Boavista, em direcção ao Largo da República. O condutor diminuiu a velocidade e… com sinal verde passou tranquilamente.
O Ti Zé abanou a cabeça, de cima para baixo.
Uma das ajudantes do Lar, certamente depois de terminado o seu turno, saiu pelo portão e encaminhou-se para um carro que a esperava, na Rua da Escola.
O Ti Zé, mudou-se para poder ver o sinal aquela rua.
Mal o veículo se aproximou do semáforo, o sinal passou para verde.
Ti Zé correu para a Rua da Boavista e pode ver o sinal vermelho, enquanto o carro virava à esquerda e se dirigia ao Largo da República.
O Ti Zé do Quartilho, tirou o boné e coçou a cabeça.
Ficou ali, especado, a olhar para o sinal que, entretanto, mudara de vermelho para verde.

(Estória, em capítulos, aos Domingos e Quartas)
Aviso: qualquer semelhança com nomes ou situações reais será mera coincidência... Esta é uma obra de ficção, resultado da pouca imaginação do autor.

Um comentário:

filipe com i disse...

oramessa, estará o Ti Zé do Quartilho a descobrir o segredo da luz do frigorífico, eureka! muito boa!