domingo, 31 de outubro de 2010

Aldeia dos 4 Montes - Cap. 8

Aldeia dos Quatro Montes



(se desejar ler os capítulos anteriores: Cap.01 a Cap.05Cap.06, Cap. 07)


8

A uma das mesas do outro lado da sala, o Senhor Director e Pedro, entretinham-se com umas alcaparras e pão centeio, daquele bem escuro.
- Meu caro, seria uma honra poder contar com uns escritos seus no nosso Mensageiro. Aliás, se me permite a audácia, quando soube que pretendia ficar por 4 Montes durante os próximos tempos, pensei que poderia elaborar uma crónica, ficando o tema ao seu livre arbítrio.
- Agradeço o convite…
- Não, não… Nós, no Mensageiro, é que ficamos gratos se o meu caro Pedro aceitar compartilhar connosco as suas ideias. Sabe… Em 4 Montes, existem poucas pessoas disponíveis para opinar livremente. Muito poucos saberão alinhavar umas linhas que façam sentido… Mas, o que mais me intriga, é que são capazes de tudo dizer e criticar nas tertúlias de uma qualquer mesa de café, porém, se os desafiar para darem à estampa, tornando público nas páginas do nosso Mensageiro, encontram sempre algo que os impede…
- A vida não está fácil…
- Não estará para ninguém… Não esconderei que o nosso Mensageiro vive com enormes dificuldades… 4 Montes não tem empresas de gabarito, poucos são os que acham que vale a pena subscrever um jornal… Mas, para mim, é um desafio que não quero perder! Enquanto puder, o Mensageiro há-de continuar a tentar trazer um pouco de luz a estas mentes.
Pedro continuou a ouvir os planos e sonhos do Senhor Director mas os seus olhos foram divagando pela sala.
Junto à janela, um casal chamou-lhe a atenção.
- Desculpe… Não me lembro daquelas caras. Aquele casal, na mesa da janela…
- Ah… Pois, o meu caro Pedro ainda não conhece o Senhor Doutor Juiz. Se não estivesse acompanhado, teria o prazer de os apresentar. Pessoa correctíssima, de fino gosto e de bom trato… Um Juiz como 4 Montes não tinha há já muitos anos.
- E a senhora será sua esposa, presumo?
- Não… O Senhor Doutor Juiz é um solteirão… A senhora é uma amiga, viúva de um grande amigo, dos tempos da Universidade. Penso até que terão sido colegas de curso.
- A senhora é formada em Direito?
- Desculpe, não me expliquei correctamente… O falecido é que foi colega…
Ana Luísa estava deliciada com o prato que António Augusto tinha escolhido. Quando a travessa chegou à mesa, só reconheceu o frango corado… António Augusto colocou no seu prato, um pouco do acompanhamento e pediu-lhe para provar.
- Mas… é muito saboroso!
- Se lhe disser que é uma espécie de esparregado, acha que acreditaria?
- Diferente…
- É de nabiças e, para além disso, como vê integra batata…
Para Ana Luísa, um esparregado era… um esparregado! Mas aquilo era diferente. E o frango era absolutamente distinto dos que poderia comer na cidade… Muito mais saboroso, sabendo mais a… frango.
A sala foi-se esvaziando de comensais.
Duas mesas, uma em cada ponta, ainda solicitavam a atenção de Maria e da Ti Joaquina. Esta pegou em duas fartas doses de uma sobremesa que ela sabia ser muito do gosto do Senhor Director.
- Ora, vejam lá a surpresa que vos preparei.
Pedro e o Senhor Director, que estavam embrenhados numa discussão sobre os minerais raros da China e do perigo que representava para o mundo ocidental que aquele país controlasse mais de noventa por cento das reservas comerciais, olharam para os pratos que a Ti Joaquina lhes pusera à frente.
- Minha excelsa senhora… Depois deste opíparo repasto, ainda tem a ousadia de nos regalar com esta tarte de camoesas? Tende piedade de nós, pobres sofredores…
- Ti Joaquina, este cheirinho à maçã camoesa é uma tentação a que nem me atrevo a resistir…
Isto dito, ambos se atiraram à tarte, que de morna que estava, se desfazia em sabores únicos…
A Ana Luísa e António Augusto tinha-lhes chegado o odor inebriante da camoesa e da canela…
O Senhor Doutor Juiz atreveu-se a fazer um gesto para chamar a atenção da Ti Joaquina…
- Ó Senhor Doutor Juiz…
- Seria possível provar um pouco dessa sobremesa?
- Maria, traz-me aí a tarte…


(Estória, em capítulos semanais, aos Domingos)
Aviso: qualquer semelhança com nomes ou situações reais será mera coincidência... Esta é uma obra de ficção, resultado da pouca imaginação do autor.

2 comentários:

filipe com i disse...

caramba, opípara crônica companheiro, há muito sabor neste escrito, talvez um dos mais gustativos de vossa lavra. edição eltrônica chega-lhe ao mail em breve. parabéns!

José Doutel Coroado disse...

Caro Missosso,
grato pelo coment e tb pela revista.
já recebi, vou ler de seguida.
abs