sexta-feira, 26 de setembro de 2008

a Bolha, a Bolsa e o Virgem Again®




Nasci, cresci, vivi ― e vivo ainda, até onde sei ― na Bolha. Uma das características mais salientes da Bolha é que ela não é visível para quem está dentro, pelo que demorei a saber da existência dela. Já para os que estão do lado de fora da Bolha, o problema mesmo é ser invisível. Havia aquele filme com o John Travolta, “O Rapaz na Bolha de Plástico”, ou clássicos como a “Bolha Assassina” com o Steve Mc Queen, mas nem assim a ficha caiu de imediato.

A Bolsa e o Virgem Again® ― assim mesmo, misturando inglês e português ―, também só descobri mais tarde na vida, na adolescência para ser mais exato. Naquele tempo havia todo um florescente mercado negro de revistas de mulher pelada, entre as quais as suecas eram as mais “liberadas”, com um nível de sacanagem comparável ao de uma novela das oito atual com problemas de Ibope. Porém, era nas similares nacionais que se via, às vezes em página inteira, os anúncios da pomada (vaginal?, peniana?) Virgem Again®.

Ao menos na minha lembrança, a embalagem do tal creme era azulada, com estrelinhas e letras brancas que alardeavam a promessa de retorno às primícias de Vênus. As estrelinhas, admito, talvez sejam cabriolas da memória, mas o causo é que, naquele então, desvirginar (se) era questão bem mais premente do que o contrário, de sorte que nunca encontrei quem houvesse experimentado as virtudes “revirginantes” do miraculoso produto.

Incrível que para abordar um assunto da moda me ocorram histórias da época em que os animais falavam e duas superpotências, EUA e URSS, disputavam o mundo. Nada restou daqueles anos dourados: animais, superpotências, EUA, URSS e, quanto ao mundo, bem... Pode ser que, como no caso do ungüento prodigioso, a Bolha e a Bolsa sejam entidades ao mesmo tempo corriqueiras e misteriosas, ou seja, tão fáceis de discernir em seus efeitos, quanto inacessíveis em seus mecanismos recônditos.

Prima facie, diria que a Bolha é o duplo da Bolsa, tanto é assim que ambas são, ou pretendem ser, cassinos virtuais que “precificam” tudo aquilo que interessa e todos aqueles em quem vale a pena APOSTAR. A Bolsa é o templo da verdadeira e única religião do ser humano: o jogo de acumulação, circulação e destruição de riquezas. A Bolha faz o mesmo com pessoas. Bolha e Bolsa confundem-se necessariamente, uma vez que atafulhar pessoas e coisas no mesmo balaio é a vocação atemporal de ambas.

A Bolsa e a Bolha têm andado ultimamente meio perrengues, mas não é doença de morte: o remédio é amargo, mas será pago pelos basbaques de sempre, papagaios de pirata que se acotovelam em volta do palco da jogatina. Por um tempo, Bolha e Bolsa vão aprender a viver descentradas, murchinhas, até mesmo um pouco vigiadas, o que, no fundo, só lhes fará bem: “emergentes” serão “alavancados”, o burguês de hoje vai ser o aristocrata de amanhã, a virtude pagará o habitual tributo ao vício e o resto o emplastro resolve. Lavou, tá virgem ― again!

2 comentários:

Siddartha disse...

Só...Gostei muito!!
" De Bolhas e Bolsas"

mauverde disse...

Tanto a Bolsa como a Bolha se reinventam o tempo todo, para que permaneçam como estão. Há sempre a inveterada (e automática, diga-se) tentativa de manter o status de funcionamento, mesmo que a longo prazo este seja autolítico, como me parece.