segunda-feira, 30 de junho de 2008

Pisar


Sentir raiva, sentir dor
Sentir prazer, frio, amor
Parte da vida no profundo
Pisar do pé neste mundo

domingo, 29 de junho de 2008

Mahalab na Casa das Rosas

PÓS-MODERNIDADE ULTRACONTEMPORÂNEA

Sociólogos de botequim filosófico, acadêmicos da casa do sabor, psicanalistas do M.S.T. e moralistas de talk show são unânimes em apontar sua artilharia crítica (de faz-de-conta) contra o poder econômico e a sociedade do espetáculo que ora vivemos. Unanimidade que, de burra, não tem nadinha; pois não? A perda de valores familiares, a desagregação familiar, as relações fluidas desta nossa modernidade “líquida” ― como está na moda dizer ―, e etcoeteras, não são características indeléveis e exclusivas dos tempos atuais.

Toda época é moderna, ao menos para quem vive nela; melhor dizendo, toda época é moderna até ser substituída por outra ― o que seja e quantos anos dura uma “época” define-se, necessariamente, a posteriori. Em segundo lugar, os gregos clássicos, que inventaram a livre circulação de idéias, praticavam esta atividade e quase todas as outras, na ágora. Literalmente, o mercado da cidade. O livre comércio, que incluía coisas obrigatórias como o culto dos deuses da pólis (havia-os privados também), garantia uma relativa liberdade de expressão.

Esta relativa liberdade veio a fazer toda a diferença do mundo para aquilo que se chamou mais tarde de “civilização ocidental”. Nossos solertes amigos helênicos, porém, logo se aperceberam do perigo que era construir o belo palácio da cidadania com um cimento que não consistia de valores, argumentação ou palavrório, mas o velho e bom equivalente universal: DINHEIRO. Veneno remédio.

Há quem diga que o capitalismo é um sistema inventado pela modernidade (olha ela aí de novo!) ocidental, digamos, a partir das grandes navegações ― a empresa colonialista, aqueles tempos dourados em que a Europa decidiu que ia tomar posse do mundo todo. Há até quem diga que o sistema capitalista representa uma ruptura com os sistemas anteriores porque “contratualiza” as relações entre senhores e servos. Isso é coisa de gente que nunca trabalhou como operador de telemarketing...

Sustento que o capitalismo não é um sistema, mas o sistema de economia política que o Homo sapiens (?) pratica desde que saiu da África, pelo menos. O capitalismo já existia antes do capital; bem antes da invenção da moeda, havia já formas de mais-valia inscritas no trabalho social, de violência mascarada, na forma de totens, objetos, cerimônias, cantos, lugares mágicos/sagrados: tudo que concentra mana, ‘chi ou axé já configura um gadget capitalista, um dispositivo legitimador da eficácia da autoridade. A magia é uma empresa cuja razão social é acumular poder. É TUDO CAPITALISMO!!!

O potlatch, dádiva que instaura a dívida comunitária, já é um refinamento do aparelho de segmentação e estratificação de classes. Ignorar o fluxo em mão dupla que vai do capital econômico ao capital simbólico e vice-versa, é obscurecer a origem do trabalho coletivo que desperdiça/catalisa energias grupais e instaura a dominação. Diferentes formações sociais correspondem a diferentes graus de objetivação do capital social acumulado, variantes mais ou menos estáveis, a depender de conjunturas específicas locais e globais. Só o capitalismo funcionou e funciona porque está solidamente ancorado em características humanas que se juntam para formar a melhor argamassa social: o egoísmo individual e a estupidez das massas.

Achincalhar o fetiche da mercadoria, a sociedade de espetáculo deslumbrada pelas imagens, o capitalismo tardio, e por aí a fora, não só não adianta nada como não é para nada mesmo que tal crítica é feita. O poder da Palavra e do espetáculo foi desde sempre temido, combatido e usado na condução das multidões; quando uma seita evangélica (com particular talento para slogans) dos dias atuais proíbe a televisão a seus fiéis, apenas repete o gesto de profetas hebreus, iconoclastas bizantinos e muçulmanos ― para os fetichistas da Palavra, a imagem é a antena parabólica da Besta.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

ONIÓGRAFO

Arqueologia dos restos
do meu avô:

na ilha mítica
do amanhecer
ouço
a tosse seca

no comércio diário
de brancos, machados,
rosas e encarnados

Sobre-humano
nas brenhas
da Bessarábia foinquinita
onde serviu o exército

penumbra
de civilizações particulares
cozinhas, terraços e pátios
o alambique reluzente
o lagar onde abelhas
mal podem esperar
pelo vinho

Suspenso
ao lado da janela
que dá para o pomar
o barômetro
moça para fora significa bom tempo
o rapaz de calças verdes, chuva e frio
um tipo de cotidiano
tão frágil
que aprendeu a sobreviver
com as lindas refugiadas

Alepo, Smirna e Massinia

gigantescas, suas mãos amassam
côdeas de pão
suas mãos têm vagar
come
com todo o tempo do mundo
para amaldiçoar os jesuítas

nunca, jamais,
saía à rua
sem chapéu
a lhe cobrir a cabeça
nem esquecia o Patativa
“o choro da sanfona
todo sertanejo sente”

Alegorias
das 4 estações
uma para cada parede
da sala de jantar
homem obrigado
a sair de si
mesmo
em contato com as
coisas

chorou feito criança
no dia
que o touro
desembestado
atravessou a rua num carreirão
matando
seu cavalo mais querido

big farma

o ardil da palavra produz sentimento cosmético; o remédio também pode se tornar cosmético; o cosmético é cosmético. e a violência: simpósio cosmético?

quarta-feira, 25 de junho de 2008

a magia começa e acaba a conta-gotas


um fremir de raiva a sacudir o ossos
até ardia
como se a morte fosse chegar
montada em indignação impotência
no asfalto árido

mas a luz se fez
com um tapinha nos ombros
o esbugalhar de olhos incrédulos
e as palavras suaves:
"você é maior que isso."

era taxista, ele.

a vida
pode ganhar nova dimensão
ali na esquina.

terça-feira, 24 de junho de 2008

a matadeira

"O derrubador" de José Ferraz de Almeida Jr.

A América Latina tem cerca de 10 % da população mundial e quase 50 % dos assassinatos que acontecem no mundo.



O escritor cubano Cabrera Infante se perguntava: em que outro lugar do mundo poderia existir uma cidade que ostentasse com orgulho o nome de 'Matanzas'?


No ciclo do café, em que se destruiu boa parte da Mata Atlântica nativa no sudeste brasileiro, as árvores eram derrubadas até nas encostas; uma delas era escolhida por lenhadores experientes para ser a 'matadeira' -- aquela que, ao cair, arrastaria as outras, derrubando-as.

O Brasil tem um cadastro nacional de carros roubados, mas não tem um de pessoas desaparecidas.
O cão ladra.
Será ladrão?
A hora não passa.
Outros cães respondem
na língua de cão.
Estrelas giram acima
da noite e do Hotel Central.
Ato idiota.
Sempre o malandro
morre na mão
dum otário.
O assassino espera
mascando chi
cletes.


segunda-feira, 23 de junho de 2008

Eliot estava certo ou cego?

A poesia não é uma liberação da emoção,
mas uma fuga da emoção;
não é a expressão da personalidade,
mas uma fuga da personalidade.
Naturalmente, porém,
apenas aqueles que têm
personalidade e emoções
sabem o que significa
querer escapar dessas coisas.

T.S.Eliot


Será?

domingo, 22 de junho de 2008

o impensável


escrever é procurar
como um cego
andar
feito louco
aos esbarrões
pela sala dos ecos
a
fora

é buscar princípios
na memória
ao contrário
em que o fim
sempre esteve
no percurso

e o que deveria
ser meio
desdobra
inícios
e toda demanda
envia
a um reencontro

e onde contar
uma história
não é mais
que cruzar
acrescentar
lacunas
sordidez
& demência

a origem deve estar
perdida
para que seja
possível
deve dançar
como uma agulha
numa tempestade
magnética

ou doer como um
brinquedo
perdido
durante
uma mudança

chegamos outros
à cidade
natal
transidos
desertos
tresnoitados de tantos
caminhos e adiamentos
enriquecidos
de ausências
banhados
no riocorrente
riomeandro

porque os objetos
e os fracassos
construíram
um destino
fazendo
de nós e dele
inseparáveis
(uma coragem que a alegria não teve)

porque no mar
há trajetos
tantos
como no céu

ninhos
e o inominado
era só
um pássaro
sem
sentido

sexta-feira, 20 de junho de 2008

a prateleira da má literatura - parte 1


"Cultura é norma, arte é ruptura."Jean-Luc Goddard

Radan Eminescu foi contratado para trabalhar como atendente na livraria de uma pequena editora. Não poderia, mas foi. Radan era bolsista de pós-graduação em letras latinas, mais especificamente, desenvolvia uma tese sobre autores romenos de vanguarda, ou talvez sobre escritores da vanguarda romena. Distinções como esta, impenetráveis para a maioria dos mortais, eram levadas a seríssimo pelo moço de 22 anos.

Os colegas de trabalho (o caixa e a faxineira da livraria) logo perceberam que o rapaz de espessas sobrancelhas, vida sofrida de imigrante e expressão dura no olhar, era pancada, zabadá de todas; o dono nem queria saber, estava feliz como pinto no lixo por ter arranjado um funcionário estrangeiro (não registrado) e tão culto como aquele. Ainda pra mais que ele, logo que chegou, deu início a uma extensa rearrumação das estantes, gôndolas e prateleiras.

Dizia que era "forte importante" um rearranjo da classificação de gêneros na livraria e insistia, com o seu sotaque estranho, que se deveria privilegiar a qualidade dos autores e obras na exposição dos volumes e coleções. O dono rebentava de orgulho, era o que queria ouvir, pois o moleque com fumos de intelectual bolchevique repetia quase literalmente as palavras de seu avô, fundador da editora e da loja.

Fosse porque a jornada dupla o estafasse, a tese empacasse, a bolsa de estudos fosse magra, ou o banzo da família tivesse apertado, o livreiro pirou na batatinha. Andava como um zumbi pelos estreitos corredores da livraria, era visto em acaloradas discussões com alguns dos livros, dava broncas na sua língua natal em algumas edições que julgava mal cuidadas, escondia traduções canhestras nos desvãos ou em prateleiras inacessíveis, além de exilar no depósito certos autores que desaprovava.

O motivo que, por fim, levou à sua demissão foi quando começou a hostilizar abertamente os clientes que vinham em busca daquilo que chamava de "má literatura"; passava descomposturas, desaconselhava manuais, biografias e obras coletivas, enfim, quando o(a)s compradores(as) se mostrassem renitentes, dizia-lhes que procurassem as "casas de tolerância" da cultura: megastores e livrarias de shopping center.

A livraria, só então o patrão se apercebeu, tinha sido dividida em duas metades rigorosas: nas prateleiras da frente ficavam os "clássicos", ou os que iam sê-lo, no fundo, em corredores atravancados por todo tipo de obstáculos, os autores e obras "menores".

quarta-feira, 18 de junho de 2008

anatomia de um crime com 180 milhões de réus



Um crime hediondo nos foi servido em rede de televisão nacional, um crime imperdoável: 3 vidas ceifadas por motivo fútil e a constatação de que a nossa sociedade civil, na vigência aparente da democracia, conseguiu o que nenhuma das lamentáveis ditaduras precendentes havia alcançado, a saber, a privatização do exército brasileiro.

Acompanhe os fatos: 11 militares estão sendo acusados de ter entregue 3 rapazes de uma favela do Rio de Janeiro aos bandidos da outra favela que os trucidaram sem dó nem piedade. O crime dos rapazes? Nenhum. Interpelados por uma equipe de militares chefiada por um tenente, os rapazes ousaram não gostar de uma revista, a famosa 'geral' na entrada da favela. Claro, um PPP (preto, pobre, periférico) de celular na cintura (volume suspeito), não pode reclamar de levar 'esculacho' de 'gambé'. Ou pode?

Levados ao batalhão, o capitão recusa-se a aceitar o suposto desacato à 'otoridade' que o tenente alegava e manda soltar; indignado por ter sido desautorizado na frente dos 'subs', o tenente resolve levar os garotos para a favela vizinha a fim de que eles tomassem um 'apavoro'. Os guardas da favela vizinha, que recebem o "presentinho" das mãos dos militares, aplicam sem pestanejar a lei da pedra: tá na comunidade errada sem autorização, 'passa o cerol'.

O chefe do tráfico, o 'patrão', percebe a cagada: os meninos não tinham feito nada, mas já era tarde, um deles chega à sua presença já morto depois de ter levado uns 'sacode' dos 'soldados'. Que fazer? Aos costumes: mata os dois restantes e 'desova' no lixão ao lado, afinal, favelado morto só vira notícia em jornal acima de um número mágico: 5 (ou 6, depende da pauta do dia). Mas ele não contava com a Rede Plim-Plim -- e aí começa o verdadeiro circo da bandidagem graúda do Brasil varonil.

O Exército Brasileiro estava na favela para escoltar um projeto político (a PPP de rico, parceria público-privada): um bispo-deputado-companheiro, da televisão-partido-religião do bispo Chuta-a-Santa, estava caiando umas casas da favela pra sair bonito na foto eleitoreira, candidato que é ao posto de alcaide da Cidade Maravilhosa. Por que isso era tão importante? O companheiro-presidente-molusco ainda está cabreiro com a Rede Televisa... ops!, Plim-Plim, que pôs no horário nobre da TV (no jornal e na revista quase ninguém lê, não tem 'pobrema') sua roupa suja no já distante episódio do mensalão e os 40 ladrões.

Vai daí que a Rede Bobo percebe na tragédia anônima uma janela de oportunidade e começa a bater bumbo em cima da notícia que, deixada a si mesma, jamais ultrapassaria a barreira do rodapé da página policial. Entendeu porque eu, você, a torcida do Flamengo e do Corinthians ficamos sabendo de tudo isto?

Como disse o filósofo nas horas vagas e traficante nas outras, Fernandinho Beira-Mar:

"TÁ TUDO DOMINADO!!!!!!!!!"

terça-feira, 17 de junho de 2008


é pra já
o círculo dos círculos
já vai fechar
como antes

abre os olhos e espia só
vai ver ele pisca de volta

*

Cidadão Arte Clube 14/06 - Espaço Cultural Cidadão do Mundo

Parecia uma noite como outras e não era, porque nesta a poesia era agora. Era conosco.
Celebramos com café, uma tensão natural e excitada, aumentada ainda pela chegada da Milene, linda, fresca, sorrisos. Chegamos ao evento cedo, armamos o ampli, os pedais, os textos, oa planos, a câmera. As imagens preparadas não podiam ser exibidas - teríamos de fazer a imagem do palco, da música, do texto. Sem acessórios. Não era brincadeira.
Rodas de conversa aqueciam a prévia, e o Escritor realmente estava lá, como a Fabi disse. Flip mansamente se achega e em cinco minutos está sustentando um debate com ele, que se mantém depois que a roda se dispersa. Eu fico assistindo e de certa forma me orgulho.
Passam os vídeos do Maicknuclear e Jam faz uma observação interessante: é legal justamente porque o Maick parece que faz EXATAMENTE o que quer fazer. Aquela forma e mensagem são a praia dele. E o que ele quer dizer chega até nós. Vem o Manoel declamar Maiakovsky e não é que seja ruim, mas é longo e não consegue manter a atenção. Foi estranho, pois os poemas são bons e a atuação é boa. Mas cansou um pouco.
O Mendez começou aquecendo, e como o Luiz não pôde estar lá, subi pra fazer a cama pro poema dele. Lírico, há um século ele teria sido facilmente um parnasiano. Apaixonado, extasiado, debaixo da pele dura e do riso forte talvez um adolescente tateando, adivinhando a próxima descoberta.
E aí era com a gente. A nossa vez de tirar o coelho da cartola. E trouxemos a nossa voz, nossos instrumentos, Jam e Flip duelando no poema dele; a Jam depois interpretando a chuva, terminando no chão ao som das minhas vozes, nunca a poesia do Flip me pareceu tão revestida do diáfano, ele que às vezes é cru quase de propósito. O Carlaccio veio depois, mas já o acompanhei como um sideman, era mais um jazz, mas um bom jazz sacana, com algumas doses de pinga e canela. O Coletivo Maloqueirista depois tentou manter a magia, mas era tarde e o caos do que se proclama underground entoou sua litania auto-indulgente e dissipou as estrelas pouco a pouco.
Agora era dormir e pedir à alma que guardasse consigo a noite.

chove chuva


no meio da enxurrada de lama

cruzamentos alagados

as proliferações do entulho semáforos apagados

a cidade é a falha coletiva

um fracasso lamentável das autoridades diz o locutor

por toda parte miseráveis os cães sem dono

o lixo

as sacoleiras gordas o surro e a poeira acumulados

bocas de lobo transbordando detritos

os ratos rios de esgoto

carregando garrafas pet

carros

buzinas muitos carros

aguardam o que está na outra margem

ninguém ouve o grito do barulho da chuva

trânsito encruzilhadas paradas a cidade entregue

a si mesma

postes de iluminação inteligentes caos

o pastor Ebenezer faz suas as palavras de São Tomé

toda mulher que se fizer homem entrará no reino celeste

um sofá na correnteza do córrego

passa as ruas se chamam ministro capitão doutor engenheiro coronel desembargador

e todos estão mortos

paisagens que atravessam chumbo

uma quadrilha de bancos paga as reservas para as férias dos magistrados

em um resort ensolarado

as sementes se enterram para outra estação

mapas invertidos cones em lugares inesperados

o amante se lembra como teriam sido felizes se

tudo chove

rádios cobrem a tragédia dos desabrigados ao vivo

helicópteros transportam presos de alta periculosidade

alguns arriscam uma travessia na enchente buscando

filhos compromissos inadiáveis gatos sem ração entrevista de emprego

estátuas eqüestres fingem o silêncio da pedra

a multidão em suspenso espera uma trégua do dilúvio

a novela e os telejornais começam na hora de sempre

nuvens resfolegam sua carne líquida desaba sobre a zona norte

os senhores do silêncio em silêncio

um garoto de programa dorme enquanto cirurgias são desmarcadas

lotações várias kombis dezenas de vans e peruas fuscas foram roubados

a mulher se abriga na marquise sabe que traz no sangue o filho do homem

um entregador de pizzas ensina ao colega que ninguém encontra a felicidade

no mundo material

Michelly decide que vai usar chapinha no cabelo com a franja cobrindo um dos olhos

realçando ambos com sombra escura

chuva na metrópole

chuva na metropole

chuve a chuva e não pára de desaparecer

http://br.youtube.com/watch?v=7ABSQbd81ZQ

Gaia Ciência



A ciência tem se valido de poucas mas eficientes estratégias para produzir seus resultados.
Simplificando bastante podemos elencar 5 regras práticas: o que é, é, o que não é, não é, exclui-se a contradição (princípio do terceiro excluído), exige-se a reprodutibilidade dos resultados e a falsificabilidade (termo popperiano[i][i] que indica que uma teoria precisa ser passível de teste experimental, a "falsificação" da mesma).
A partir deste esquema singelo foi possível chegar às vacinas, à eletricidade e a pisar na Lua, com estes princípios também se espera chegar aos arcanos do cérebro humano.
Desde o fim da Antigüidade, momento em que a ciência pôde se libertar do peso e das exigências da religião, começaram a ser lançadas as bases do que viria a ser a ciência moderna. Galileu Galilei em 1610 com o Sidereus Nuncius, Francis Bacon em 1620 com o Novum Organum[ii][ii] e René Descartes[iii][iii] em 1637 com o seu Discurso do Método são os arautos desta nova maneira de investigar a natureza.
[i][i] Popper, K. - Conjectures and Refutations. The Growth of Scientific Knowledge, London, Routledge, 1963.
[ii][ii] DESCARTES, R. - Discours de la Méthode, Librairie Larousse, Paris, 1973.
[iii][iii] BACON, F. - Novum Organum, Nova Cultural, Coleção Os Pensadores, São Paulo, 1999.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

maiakovski do jardim casqueiro

ducor ou non ducor?
a dúvida: aceitar a condução passiva ou recusá-la?
em 1500 na vila são paulo, a vida se resumia a prender ou ser prendido: tomar o corpo do outro ou ter o próprio corpo apropriado
e você? como parafusa a vida?

domingo, 15 de junho de 2008

O Maiakovski do Jardim Casqueiro


As 3 Regras de Ouro para sobreviver no meio cultural Underground:

1. o underground NÃO é o contrário do mainstream (embora berre o oposto)
2. a massa não despreza nem o underground e nem o mainstream (ambos são bem definidos e a massa amorfa ADORA o que não é espelho)
3. nunca, nunca mesmo, vá sem claque, bando ou matilha se apresentar num palco udigrudi (off e on Broadway, a brodagem é fundamental)

Encontrei um escritor que admiro no dia em que ele lançava seu novo livro num centro cultural bem simpático, na periferia da Matrix. Apresentados por amigos comuns, começamos um papo animado sobre... literatura brasileira atual. Assunto cascudo, deprê.

Escrevo para 300 leitores, cara, ele me confessa, são sempre os mesmos e o pior: eles estão envelhecendo. Conta que passou sete anos de pastor para publicar seu primeiro livro; conseguiu finalmente na onda do boom de novos escritores dos anos 90 (a mini-retomada literária) e afirma que essa onda já morreu na praia.

Diz que costuma entrar em grupos de discussão de literatura na internet e que as comunidades têm no máximo 50, 80 participantes. Não chegam nem perto dos que se reunem em grupos de auto-ajuda aos possuidores de pelos brancos no suvaco e até música clássica e xadrez dão banho nos amantes das letras.

Políticas de fomento, editores sócios de bancos, agentes culturais e até os escritores medalhões da geração anterior à dele que não o ajudaram no começo, são malhados na conversa regada a água mineral e decepção. Mas ele sabe, ou acredita, que, na geração dele, está no grupo restrito de "um ou dois que vão ficar".

É isso: ele está lançando um livro sem divulgação, sem distribuição, sofre de hipertensão e pena pra pagar o condomínio, mas tem uma satisfação íntima -- vai "ficar". Falamos en passant da literatura russa; a Rússia, esse país que foi modernizado a ferro e fogo por tiranos como Pedro e Catarina e, last but not least, forjado por GERAÇÕES de grandes, médios, pequenos e inesquecíveis poetas, dramaturgos, artistas plásticos, cineastas, músicos e romancistas.

Fim do papo, alguém lê o epílogo do livro do meu novo "amigo". Lá está a advertência direta e reta aos Maiakovskis do Jardim Casqueiro: "não me mandem manuscritos".



sexta-feira, 13 de junho de 2008

a propaganda é o negócio da alma



A frase não é minha, é de um famoso marqueteiro (passe a redundância) e socialite; não o tomo por ingênuo, mas é daquelas boutades que dizem muito, dizem demais, sobre o mundo em que vivemos.

Os nazistas eram um bando de lunáticos faustianos, estetas medíocres e militarmente míopes, mas um troféu ninguém lhes há de negar, aperfeiçoaram o gadget social mais eficaz do século XX: a propaganda para as massas.

Muitas técnicas de propaganda anti-semita desenvolvidos pelos nazistas são hoje "cases de sucesso" e se repetem à exaustão nas peças publicitárias. Há o caso clássico das propagandas sobre os guetos judaicos que eram exibidas antes dos filmes no cinema: apresentavam-se imagens de pobreza, doença e idosos de longas barbas em estado de semi-mendicância e fundiam-nas às imagens de ratos, baratas e sujeira. Estabelecia-se, assim, visualmente, o link entre duas idéias diferentes, criando a equivalência imediata: judeu=sujeira, sinônimo de infecção de uma raça e sociedade puras.

Compare com o comercial de bebida em que a mulher é associada às curvas da garrafa da cerveja, ou o carro e seus acessórios são assemelhados ao corpo e à personalidade do humano que o dirige(?). Mensagem: você é tão bom como o carro que usa, a mulher que consome, o sistema que te captura. Uma questão de estilo, afinal, não se vende produtos, mas idéias, conceitos. The nazis known better...

Falando em conceito, e a arte, o que tem a ver com isso? Tudo. E mais um pouco.

A arte, para o bem e para o mal, não fica fora dessa lógica. O importante, hoje e sempre, é "causar", aparecer a todo custo. Um (soi-disant) artista guatemalteco pegou um cachorro de rua, amarrou-o e largou-o numa galeria de arte, onde o pobre animal ficou até à morte. Verdade, mentira? Não importa, o artista-celebridade típico da contemporaneidade está onde a fama estiver.

Só que isto não é novo. A mídia é uma caixa de ressonância do pior e do melhor; a história registrou o nome do imbecil que ateou fogo ao templo de Diana em Éfeso para assim entrar nela. Funcionou, não funcionou? Dá um search que você acha.

Há poucos dias, um aluno de artes resolveu "tocar um terror" na faculdade onde era bolsista e apresentou um trabalho de conclusão de curso sui generis: chamou 40 manos e pichou o edifício e o local da exposição. "Ação", "intervenção", "happening", "terrorismo", que importa o rótulo?

Abra os olhos e verá a inevitável marca na história. O moço também -- como reza a praxe dos artistas muderrrnos -- escreveu um arrazoado que se intitula Marchando ao Compasso da Realidade. Transcrevo um trecho iluminador:

"A arte hoje em dia é para quem está na pegada. Para os bunda-moles ela já morreu faz tempo."

Sem mais perguntas ao artista-réu.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

A Noite



À noite é que as coisas reais acontecem. O dia é café com leite. A noite é pra valer. Porque de dia você tem ganhar dinheiro, cuidar do material, falar de negócios, fechar contratos. Horário comercial. Veste filho, dá comida, leva, vai buscar. À noite, filho dorme (bom, pelo menos os meus dormem, por enquanto). A gente faz sexo, tem conversas sobre signo, sobre música, sobre amor. A gente compõe, toca, faz música, faz arte. A gente se olha diferente e tem outros pensamentos. À noite tudo é mais real.
O dia seguinte muitas vezes é decepcionante porque a noite ficou com a magia pra ela. O dia é nu. A noite usa véu. Por isso, encanta.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

A Grande Mutação Contemporânea

Gostei desse texto do Milton Santos porque põe um pouquinho de (possível) luz no final do túnel. O DURO MESMO é que isso depende de COMO o Homem dispõe dos meios que tem. Aí é que o rabo torce a porca, hehehehe...

"A grande mutação contemporânea

Diante do que é o mundo atual, como disponibilidade e como possibilidade, acreditamos que as condições materiais já estão dadas para que se imponha a desejada grande mutação, mas seu destino vai depender de como disponibilidades e possibilidades serão aproveitadas pela política. Na sua forma material, unicamente corpórea, as técnicas talvez sejam irreversíveis, porque aderem ao território e ao cotidiano. De um ponto de vista existencial, elas podem obter um outro uso e uma outra significação. A globalização atual não é irreversível.

Agora que estamos descobrindo o sentido de nossa presença no planeta, pode-se dizer que uma história universal verdadeiramente humana está, finalmente, começando. A mesma materialidade, atualmente utilizada para construir um mundo confuso e perverso, pode vir a ser uma condição da construção de um mundo mais humano. Basta que se completem as duas grandes mutações ora em gestação: a mutação tecnológica e a mutação filosófica da espécie humana.
A grande mutação tecnológica é dada com a emergência das técnicas da informação, as quais — ao contrário das técnicas das máquinas — são constitucionalmente divisíveis, flexíveis e dóceis, adaptáveis a todos os meios e culturas, ainda que seu uso perverso atual seja subordinado aos interesses dos grandes capitais. Mas, quando sua utilização for democratizada, essas técnicas doces estarão ao serviço do homem.

Muito falamos hoje nos progressos e nas promessas da engenharia genética, que conduziriam a uma mutação do homem biológico, algo que ainda é do domínio da história da ciência e da técnica. Pouco, no entanto, se fala das condições, também hoje presentes, que podem assegurar uma mutação filosófica do homem, capaz de atribuir um novo sentido à existência de cada pessoa e, também, do planeta."

democracia, o conto da carochinha


Era uma vez um reino inacabado. Ficava bem, bem, bem longe, na periferia do mundo, até que o mundo perdeu o centro e aquele reino emergente tornou-se um paradigma da modernidade de fachada.

Uma terrível praga de madrinha assolava o reino: a gente daquela terra rica vivia como se pobre fosse. O Rei escorchava o povo e vivia emprestando dinheiro da nobreza, esta, vivia dos favores da Viúva e o poviléu, bem, o populacho vivia mesmo era ao Deus-dará!...

Muitos reis militares, guerreiros sem guerra, se sucederam no trono até que este País de Cocanha resolveu se tornar um califado democrático e eleger o soba e seus asseclas por sufrágio popular. Os agiotas reinóis viviam no paraíso dos juros: um acordo de cavalheiros dos bancões fazia com que governo e povo vivessem com a corda no pescoço.

Não tenham dúvidas, amiguinhos e amiguinhas, com taxas e lucros mais altos que o Pé de Feijão do João, os nobres rentistas viveram felizes para sempre.

(i)Moral da História: pelo menos os milicos, de tempos em tempos, trocavam o gorila dentro da farda...

terça-feira, 10 de junho de 2008

a moda do mundo

Frase do dia:
"A vida não é mãe, é madrasta, e Deus é pai, mas um tanto ausente..."


lótus

Frase do dia: "A vida não é mãe, é madrasta e Deus é pai, mas um tanto ausente..."

segunda-feira, 9 de junho de 2008

O Menino Maluquinho e o seu Milhãozinho


Na Grécia antiga, coroavam-se os atletas, os guerreiros e os poetas. Platão propunha, com sabedoria, vim a admitir mais tarde, que os poetas devem ser coroados e, logo em seguida, exilados. Platão sabia das coisas.
Nossos ídolos podem nos desapontar, pior, eles sempre vão nos desapontar... basta que a gente viva para ver. Por isso é que hoje não tenho mais ídolos, nem no esporte, nem nas artes e muito menos na política!
Recentemente a justiça (?) brasileira concedeu uma polpuda indenização ao cartunista Ziraldo, criador do imortal Menino Maluquinho -- R$ 1.000.000,00! O cartunista alega ter sido prejudicado em sua carreira pelo regime militar vigente entre 1964 e 1984 no Brasil.
Aqui vemos a nossa forma maneirinha de fazer história: nunca encarar de frente, nada de dar o nome aos bois, jamais jogar luz no passado sujo de milicos e terroristas. Aos primeiros, concede-se a impunidade, aos segundos, a mesma impunidade e uns trocados. Argentina, Uruguai, Espanha e Portugal, pra ficar em poucos exemplos, abriram seus arquivos dos anos de chumbo. E nós, temos medo de quê?
O que não é possível neste país tropical com uma marquetagem eficiente e bon$ advogado$! Depois de vender seus trabalhos para a propaganda nacionalista do governo Médici, Ziraldo consegue ser indenizado na onda das compensações em dinheiro (a bolsa-ditadura) -- somos, e Ziraldo mais ainda, uns gênios!
Então fica assim: Ziraldin, mineirin espertin, meninin maluquin que não rasga din-din, levou seu milhãozin. Pena que foi o seu, o meu, o nosso suado dinheirin...
Eu, que nunca em dias de minha vida botei os olhos em cima de uma dinheirama dessas, fiquei a saber que cor tem 1 milhão de reais: É FLICTS!!!!!!!!!

P.S.: não sejamos injustos, outros têm se beneficiado da indústria de indenizações, pex., Carlos Heitor Cony. O curioso é que vítimas pobres da ditadura não conseguem...

sábado, 7 de junho de 2008

sexta-feira, 6 de junho de 2008

a mirada anterior


O mundo em que vivemos, sentimos, pensamos, aparece desfigurado e distorcido porque embaixo dele há correntes de água, veios e ruínas, os destroços do Real -- é um mundo horrível e belo, assustador ou aconchegante, que se manifesta e dissipa, em que se constroem e tombam quaisquer sentidos, vagos que sejam; onde não há razão de ser. É um mundo maravilhoso... mas sempre, em última instância, imaginário.


Parar o mundo, suspender juízos e opiniões recobrar o prodígio que está na realidade de todos os dias: ela é!


Todos já tivemos um dia esse olhar, essa capacidade de escutar o silêncio, todos já soubemos do invisível, imperceptível instante em que o tempo pausa, entre uma pulsação e outra. O que me interessa é recuperar a visão direta das coisas, ouvir o rumor da existência quando a noite caiu na cidade insone.


A outra vida está aqui.